Saúde mental
Diz a Directora de Psiquiatria do Hospital São Francisco Xavier sobre o fecho do Miguel Bombarda e sobre a Saúde Mental em Portugal:
A Lei Nacional da Saúde Mental não protege nem doentes, nem familiares, nem a comunidade.
Como é que eu sei? Porque já a li, e por a ter lido, posso dizer que neste país para um doente mental ser internado e tratado de forma compulsiva tem que pôr em risco a sua vida ou a dos que a rodeiam. Depois vem toda a burocracia à portuguesa. E o mesmo acontece com a medicação compulsiva. Pode-se "obrigar" um doente a tomar a medicação, mas tem que estar tudo num pé de vento.
Falam em fechar os hospitais psiquiátricos para os doentes mentais viverem em sociedade, e criar uma rede de cuidados continuados nos hospitais distritais que também servem para internamentos de curta duração. E onde é que os hospitais distritais têm essas infra-estruturas??Não têm digo eu.Não têm nem infra-estruturas, nem camas, nem psiquiatras e enfermeiros em número suficiente para que o doente mental seja dignamente acompanhado tanto durante o internamento como cá fora. Essas ditas unidades não passam de um andar dividido em duas aulas, e nessas alas encontram-se pessoas das mais diversas idades, estratos sociais e patologias mais crónicas, menos crónicas, mais ou menos graves.Encontramos um esquizofrénico a dividir um quarto com um depressivo e um psicótico. As nossas psiquiatrias são o que eu chamo um regabofe, tudo ao molho e fé em Deus, com o pensamento de "vamos estabilizar a pessoa rápido para a mandar para casa, porque as camas nos corredores estão ocupadas,e há mais gente que precisa de se tratar".
Parece duro?É a nossa realidade.Vão fechar os hospitais psiquiátricos públicos, para que os doentes possam ser integrados em sociedade, e tenham acesso à suposta rede de cuidados continuados que não têm capacidade para fazerem face a tantos doentes. Como é que fazer com que o esquizofrénico que está internado há dezenas de anos, cuja família não existe ou não se interessa? Vão comprar-lhe um apartamento e dizer "agora safa-te porque estás no meio da selva???"
E quando são dados os máximos cuidados a nível psiquiátrico a um doente e falham os cuidados sociais?Falham porque a família não pode deixar de viver, falham porque a família não tem capacidades financeiras para colocar o doente numa casa de saúde?
O que é que fazemos a esses doentes??
O que é que fazemos a nós quando deixamos de conseguir cuidar dos doentes e de nós mesmos??
Colocamos os doentes nas ditas unidades de cuidados continuados?
E depois o que se faz??
O que fazer a estes doentes???
Como é que vão ser integrados??
Não têm a noção de que ainda vão desestruturar ainda mais a vida destas pessoas??
"(...)Em Portugal estamos muito longe de ter uma rede de tratamento na comunidade que ofereça cuidados adequados aos doentes mentais graves.Uma reforma dos serviços psiquiátricos necessita de um orçamento robusto para a criação dessa essa rede e ao longo destes 40 anos e de outros planos falhados de reforma da saúde mental, essa disponibilidade orçamental nunca existiu.Sem orçamento e sem recursos não há reforma.Das oito estruturas que devem existir na comunidade em alternativa ao Hospital Psiquiatrico, Portugal implementou apenas de 3 desses recursos e em muitos locais até menos.(...)Para onde foram os doentes asilados neste hospital e como foi efectuado esse processo de recolocação, sabendo-se que todos os estudos aponta para a necessidade de um trabalho rigoroso de avaliação das necessidades destes doentes, muitos deles já idosos e sem qualquer capacidade para voltar a família ou mesmo para serem reintegrados socialmente?Há relatos de transporte de doentes em carrinhas, durante semanas, transferidos do hospital Miguel Bombarda para o Hospital Júlio de Matos, provavelmente para viverem em condições idênticas ou piores, ao arrepio de todas as recomendações internacionais.Qual a taxa de morbilidade ,mortalidade e de suicídios nestes doentes do hospital Miguel Bombarda, transferidos compulsivamente para outros locais?(...)Num pais que esta mergulhado numa intensa crise social e económica, geradora de mais vulnerabilidade psicológica indutora de descompensações graves em pessoas com doença mental, não deixa de ser estranha a apressada saída do coordenador da saúde mental que liderava uma reforma, e o fecho de um Hospital Psiquiátrico, com património arquitectónico e um espolio importantíssimo, também totalmente negligenciado neste processo.Em nome da psiquiatria portuguesa tantas vezes muito avançada para a época quer pela moderna legislação dos anos 60, quer pela prática clínica a par da correntes cientificas europeias e sobretudo em nome dos doentes mentais graves silenciados pela natureza da sua doença, os responsáveis pela actual reforma têm de esclarecer publicamente qual o exacto ponto de situação da reforma psiquiátrica, com dados concretos, quais as estruturas que substituíram o Hospital Miguel Bombarda, o que foi feito com os doentes deste hospital, com os técnicos e entre muitos outros dados, o que planeiam fazer com o espolio do Hospital Miguel Bombarda.Em suma, como pensam organizar os serviços de psiquiatria, sem dinheiro, sem recursos, sem a mobilização dos técnicos e com um numero crescente de patologia mental e de doentes a precisarem de tratamento!"
A Lei Nacional da Saúde Mental não protege nem doentes, nem familiares, nem a comunidade.
Como é que eu sei? Porque já a li, e por a ter lido, posso dizer que neste país para um doente mental ser internado e tratado de forma compulsiva tem que pôr em risco a sua vida ou a dos que a rodeiam. Depois vem toda a burocracia à portuguesa. E o mesmo acontece com a medicação compulsiva. Pode-se "obrigar" um doente a tomar a medicação, mas tem que estar tudo num pé de vento.
Falam em fechar os hospitais psiquiátricos para os doentes mentais viverem em sociedade, e criar uma rede de cuidados continuados nos hospitais distritais que também servem para internamentos de curta duração. E onde é que os hospitais distritais têm essas infra-estruturas??Não têm digo eu.Não têm nem infra-estruturas, nem camas, nem psiquiatras e enfermeiros em número suficiente para que o doente mental seja dignamente acompanhado tanto durante o internamento como cá fora. Essas ditas unidades não passam de um andar dividido em duas aulas, e nessas alas encontram-se pessoas das mais diversas idades, estratos sociais e patologias mais crónicas, menos crónicas, mais ou menos graves.Encontramos um esquizofrénico a dividir um quarto com um depressivo e um psicótico. As nossas psiquiatrias são o que eu chamo um regabofe, tudo ao molho e fé em Deus, com o pensamento de "vamos estabilizar a pessoa rápido para a mandar para casa, porque as camas nos corredores estão ocupadas,e há mais gente que precisa de se tratar".
Parece duro?É a nossa realidade.Vão fechar os hospitais psiquiátricos públicos, para que os doentes possam ser integrados em sociedade, e tenham acesso à suposta rede de cuidados continuados que não têm capacidade para fazerem face a tantos doentes. Como é que fazer com que o esquizofrénico que está internado há dezenas de anos, cuja família não existe ou não se interessa? Vão comprar-lhe um apartamento e dizer "agora safa-te porque estás no meio da selva???"
E quando são dados os máximos cuidados a nível psiquiátrico a um doente e falham os cuidados sociais?Falham porque a família não pode deixar de viver, falham porque a família não tem capacidades financeiras para colocar o doente numa casa de saúde?
O que é que fazemos a esses doentes??
O que é que fazemos a nós quando deixamos de conseguir cuidar dos doentes e de nós mesmos??
Colocamos os doentes nas ditas unidades de cuidados continuados?
E depois o que se faz??
O que fazer a estes doentes???
Como é que vão ser integrados??
Não têm a noção de que ainda vão desestruturar ainda mais a vida destas pessoas??
Tão verdade e tão preocupante! :(
ResponderEliminarPois...e agora???
ResponderEliminarMalena: é preocupante e muito grave. A saúde mental neste país é muito mal tratada, e os casos de pessoas com esses problemas aumentam de forma preocupante.
ResponderEliminarSupersónica: e agora???É uma boa pergunta.Quem me dera saber responder.
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